Revolucionário. Essa é a melhor palavra para definir o
primeiro disco do METALLICA, que neste ano completa 30 anos de lançamento. Um
dos divisores de águas da história do Metal, Kill ‘em All ajudou a definir o conceito que muitos hoje conhecem
como Thrash Metal. Antes, nenhum fã sabia definir direito o som do METALLICA,
palpitando algo como “um MOTÖRHEAD mais rápido” ou “RAMONES versão Heavy
Metal”.
Independente disso, a banda ascendeu rapidamente ao topo
do Thrash da região onde este som nasceu e era praticado, a San Francisco Bay
Area (Baía de São Francisco), compartilhando a mesma paixão com músicos como
Paul Baloff (EXODUS), Alex Skolnick (TESTAMENT) e Dennis Pepa (DEATH ANGEL).
Originalmente, o quarteto surgiu em Los Angeles, mas mudou-se para São
Francisco após a entrada de Cliff Burton.
Primeira foto oficial do Metallica: Kirk Hammet, Cliff Burton, Lars Ulrich e James Hetfield |
O início
Tudo começou quando Lars Ulrich, um dinamarquês filho do
tenista Torben Ulrich, se mudou para os Estados Unidos em setembro de 1980. Seu
primeiro contato com a bateria havia acontecido anos antes quando ganhou um kit
de seus avós. Ao se mudar, o baterista publicou um anúncio num jornal chamado Recycler
para formar uma banda de Metal, que valorizasse o estilo e que seguisse
carreira no gênero.
Uma das respostas ao anúncio veio de James Hetfield.
James já havia participado de algumas bandas como Leather Charm e Phantom Lord,
montadas com colegas de colégio, sendo o Phantom Lord sua primeira experiência
como guitarrista/vocalista. Outro que respondeu ao anúncio foi Hugh Tunner,
amigo de James. Os três marcaram uma jam na casa de Lars, mas este primeiro
encontro foi um fiasco, pois Lars ainda não sabia tocar adequadamente. Somente
um ano depois James e Lars voltariam a se encontrar para gravar material para o
METALLICA (que sequer havia começado).
A primeira formação: James Hetfield, Ron McGovney, Lars Ulrich e Dave Mustaine |
Já o nome tem uma origem cômica: dois amigos de Lars, Ron
Quintana e Ian Kallen, queriam lançar um fanzine sobre Metal, mas estavam sem
nome para a publicação. Ambos fizeram uma lista no qual continha os nomes
Metallica e Metal Mania. Através de um sorteio entre os colaboradores, o nome
vencedor foi Metallica, mas Lars sugeriu que Metal Mania ficaria melhor e o
baterista, então, pegou o nome vencedor para sua banda. Antes disso, várias
foram as sugestões dadas: Thunderfuck, Helldriver, Blitz, Red Veg, Steeler,
Grinder...
As dificuldades
Gravar um disco inclui uma série de
dificuldades e obstáculos: financeira, geográfica, logística, qualidade de
instrumentos e do estúdio onde vai ser gravado, por exemplo. As demos lançadas
anteriormente pela banda antes de Kill
‘em All ajudaram a consolidar o nome do grupo como um dos melhores (senão o
melhor) do Thrash Metal. Mas para chegar dos primeiros ensaios até a gravação
do disco, foi um longo caminho percorrido.
O som do METALLICA não era aceito em
Los Angeles, visto que o lugar estava infestado com bandas de Glam Rock. Devido
isso, mudaram-se para São Francisco, no qual bandas com a mesma proposta que a
de Lars Ulrich e Cia. surgiam. Os próprios membros não dominavam completamente
seus instrumentos. James Hetfield, por exemplo, era inseguro quanto a sua voz e
não sabia se tocava guitarra ou cantava, o que o fazia errar notas e esquecer
alguns trechos das letras.
Havia também a briga de egos entre
James Hetfield e Dave Mustaine (que integrou o grupo depois de Lars ter
colocado um segundo anúncio no mesmo jornal). Este contribuiu em muitas das
composições do começo da carreira do METALLICA, mas estava bêbado e drogado na
maior parte do tempo, o que atrapalhava os shows do grupo, sendo substituído
por Kirk Hammet (ex EXODUS). Outro empecilho também enfrentado eram as
constantes mudanças de cidade.
James Hetfield e Dave Mustaine em ação |
Gravação
Originalmente, o álbum se chamaria Metal up your Ass (Metal no seu rabo) e a capa trazia o desenho de um
vaso sanitário com uma mão segurando um punhal, mas o distribuidor da Megaforce
(gravadora do full lenght em questão) recusou o serviço, alegando que a capa e
o nome eram ofensivos. Foi então que Cliff Burton, enfurecido ao saber disso,
soltou: “Why don’t we just kill ‘em all?” (Por que a gente não mata todos
eles?). A frase teve impacto tão grande em todos que pegaram a sentença (kill
‘em all) para nomear o disco.
Já a capa foi mudada por James e Lars e é a que conhecemos
hoje, a poça de sangue com o martelo e a sombra da mão. A capa e o nome
originais podem ser vistos estampadas em camisas. Metal up your ass também era
usado constantemente por Hetfield para atiçar a platéia e interagir com ela.
O estúdio usado para gravar Kill ‘em All foi indicado por
Joey DeMaio (MANOWAR) e chama-se Music America Studios, localizado em Nova York
e de propriedade de Paul Curcio. Este também produziu o debut, apesar de não
ter familiaridade com o Metal, mas sabia operar os equipamentos. O orçamento
usado também surpreendeu a todos: apenas 18 mil dólares.
Graças a muito esforço e perseverança, conseguiram gravar
o material em três semanas (10 à 27 de maio). Alguns fatos curiosos rondam a
gravação do disco: Lars jura até hoje que o salão oval do estúdio era
assombrado e pedia para alguém ficar perto dele, pois, do nada, os bumbos e os
pratos começavam a tocar sozinhos. Cliff não deixou ninguém ouvir seu solo de
baixo até que ficasse pronto (o solo em questão é Anesthesia [Pulling Teeth]),
ficando trancado e sendo observado pelo vidro. Para esta composição, o baixista
usou pedais de guitarra para ampliar a distorção. Oficialmente, Kill ‘em All saiu no dia 25 de julho de
1983.
De Hit the Lights à Metal Militia
Kill
‘em All apresenta todas as faixas que faziam a festa dos
banguers da Bay Area. O grupo já tinha alguns esboços de Ride the Lightning, The Call
of Ktulu e Fight Fire with Fire,
mas estavam incompletas, por isso o METALLICA optou por deixá-las para o
próximo disco. Em resumo, o álbum tem influencia do Metal Britânico, de bandas
como IRON MAIDEN, MOTÖRHEAD,
SAXON, JUDAS PRIEST e DIAMOND HEAD, sendo esta última a principal influência do
quarteto, e é um Thrash/Speed Metal pra não deixar ninguém parado.
A faixa de abertura é Hit
the Lights, uma música pra festejar mesmo, com solos nos intervalos entre
uma estrofe e outra, com sua melodia e rapidez marcantes, foi a primeira
composição oficial da banda. Logo após, vem The
Four Horsemen, faixa marcada pela polêmica de ter sua letra reescrita por
Hetfield por se tratar de uma música, originalmente, composta por Dave Mustaine
e que depois apareceu no disco de estreia do MEGADETH sob o nome Mechanix.
Três diferenças entre as duas versões: a letra, o tempo
de execução (a do MEGADETH é mais rápida) e um trecho sonoro; enquanto The Four Horsemen tem riffs e solos
cadenciados no meio, Mechanix tem uma
intro diferente da melodia principal.
O terceiro petardo é Motorbreath,
composição inteiramente de James e que mostra um grande desempenho vocal, visto
que, na época, ele ainda mostrava grande insegurança acumulando as duas
funções. A próxima é Jump in the Fire
e é um pouco destoante das demais músicas: mostra mais influências do Metal
tradicional, mas nem por isso deixa de ser uma ótima música.
A supracitada Anesthesia
(Pulling Teeth) de Cliff Burton era a próxima e dava uma acalmada no disco
para então entrar chutando tudo novamente com Whiplash, composição rápida e agressiva que falava da experiência
de estar num show de Metal, resumindo bem o que acontecia nas performances da
Bay Area.
Phantom
Lord,
composição inspirada no nome de uma das bandas de Hetfield, assim como The Four Horsemen, tem um trecho
cadenciado no meio (em ambos os casos, a banda, atualmente, não executa essas
passagens ao vivo). A faixa exala rapidez e agressividade, assim como todas as
outras, culminando com o grito desesperado do vocalista “Fall to your knees and
bow to the Phantom Lord!!!”.
O full length segue com No Remorse (com um solo fenomenal logo no início e uma enxurrada de
riffs certeiros e cortantes perto do final), o hino Seek and Destroy (praticamente obrigatória em todos os shows) e a
super rápida Metal Militia, no qual
James canta sobre espalhar a mensagem do Heavy Metal pelo mundo todo.
No quesito produção, Paul Curcio, apesar de não entender
muito bem de Metal, não deixou a desejar e o disco saiu com uma boa qualidade
para a época. Mesmo com a saída de Dave Mustaine para a entrada de Kirk Hammet,
as composições não mudaram muito, pois a maioria foi composta por James e Lars.
Mesmo assim, os créditos foram devidamente dados ao agora frontman do MEGADETH.
Repercussão
Muitos amaram o disco, outros nem
tanto por estarem acostumados com as versões demos das músicas e estranharem o
trabalho mais refinado. Diferenças a parte, o fato é que Kill ‘em All abriu as
portas para o Thrash Metal como um movimento cultural a ser reconhecido e
respeitado, caindo como uma bomba nuclear no cenário musical dos Estados Unidos
e influenciando as demais bandas que haviam no local. Só nas primeiras horas do
dia do lançamento, o álbum vendeu 7 mil cópias. A imprensa especializada também
o elogiou à exaustão, chamando-o de “o verdadeiro nascimento do Thrash”.
As diferentes prensagens de Kill 'em All lançadas pela Megaforce Records |
O disco também saiu na Europa,
pegando os banguers de surpresa. Os ingleses que haviam inspirado o som do
METALLICA agora estavam espantados com a qualidade do grupo. Nesse continente,
o quarteto ganhou diversos prêmios e a Megaforce ganhou diversas propostas de
outras bandas, como ANTHRAX, MANOWAR e RAVEN. Para a promoção de Kill ‘em All, o proprietário da
Megaforce organizou uma turnê pelos Estados Unidos com METALLICA e RAVEN (que
lançara o disco All for One).
A tour foi batizada de Kill ‘em All
for One (agregando os nomes dos dois lançamentos), começou em 27 de julho e
durou três meses. O METALLICA continuou a turnê sozinho e ela durou até Janeiro
de 1984. Ao terminar essa turnê, a banda emendou com uma tour européia,
chamada de Seven Dates of Hell e, de lá, preparou-se para gravar o segundo
disco. Era a vez dos ingleses renderem-se a essa nova avalanche musical chamada
METALLICA.
Legado
Para comemorar o aniversário, a
banda, em parceria com a fabricante de sapatos Vans, lançou um modelo de tênis
trazendo estampada a capa do disco. O Orion Music and More foi um evento criado
especialmente para este aniversário que contou com o set list normal e o full
lenght tocado na íntegra.
Um tributo também foi lançado sob o
nome de A Tribute to Kill ‘em All e
contou com a participação de bandas como ANTHRAX, MOTÖRHEAD, PRIMAL FEAR e
CANNIBAL CORPSE. A banda NITROMINDS também se inspirou na arte do debut para
nomear um de seus discos como Kill Emo
All (uma brincadeira com a pronúncia do nome).
Não há dúvidas quanto à importância
que este disco tem no Heavy Metal. O METALLICA liderou uma geração inteira de
metalheads com seu som inovador e agressivo e conseguiu colocar no mainstream
um estilo que estava fadado ao underground e que não era, aparentemente, viável
comercialmente. Único e desafiador, Kill
‘em All foi só o ponto de partida para uma carreira sólida e de muito
sucesso, seguido por discos que se tornariam essenciais dentro do Thrash Metal.
Parabéns, Kill ‘em All!
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